Lucas Ferraz: “Para o segundo corte, faremos nova negociação interna e pretendemos que ele seja permanente” — Foto: Edu Andrade/Ascom/ME
Um novo corte de 10% da Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul neste ano depende principalmente de duas medidas em elaboração pelo governo federal e ligadas ao transporte marítimo. Na avaliação do Ministério da Economia, a aprovação dessas medidas ajudaria a diminuir o custo de produção no Brasil e abriria espaço para mais um corte da tarifa, que pode ser realizado ainda em 2022.
“Com as reformas que já foram feitas e outras que virão neste ano, entendemos que haverá espaço para outra rodada de redução de 10% da TEC”, disse ao Valor o secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Lucas Ferraz.
A TEC é uma espécie de taxa unificada entre os países do Mercosul e cobrada sobre a importação de produtos de fora do bloco, embora não haja incidência sobre diversos bens.
Segundo o secretário, depois da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) realizada no fim de fevereiro, o governo federal anunciará o corte da alíquota do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) – uma taxa cobrada sobre fretes marítimos. Em transportes de longas distâncias, a alíquota é 25%. Além disso, o Ministério da Economia quer excluir a incidência de impostos sobre a taxa de capatazia. A capatazia é a quantia cobrada pelos portos para movimentar as cargas, montante sobre o qual incidem impostos. Nos cálculos da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), as empresas importadoras podem economizar anualmente de R$ 600 milhões a R$ 1 bilhão com a mudança na capatazia.
A essas medidas somam-se as reformas realizadas nos últimos anos e que ajudaram a baixar, mesmo que de maneira indireta, os custos de produção no Brasil e melhorar o ambiente de negócios, de acordo com Ferraz. Ele cita como exemplos os novos marcos regulatórios, a independência do Banco Central (BC) e a reforma da Previdência. O Ministério da Economia contratou, inclusive, a Fundação Getulio Vargas (FGV) para elaborar um indicador que meça as variações do custo de produção no Brasil. A primeira medição está sendo realizada atualmente.
Em novembro de 2021 o governo federal já tinha diminuído a tarifa em 10%. O corte foi temporário, com duração prevista até o fim deste ano. Isso porque as regras do Mercosul estabelecem que um corte permanente precisa ser consensual. O Uruguai, por sua vez, atrelou esse corte à possibilidade de negociar acordos de livre-comércio com outros países que não sejam do bloco, independentemente de os outros integrantes concordarem (a chamada “flexibilidade negociadora”). A partir daí, o Brasil usou uma cláusula que permite o corte de forma temporária.
“Tão logo o Uruguai oficialize o movimento da TEC – e ele não é contrário, mas insiste na flexibilização -, o corte feito pelo Brasil será acompanhado pelos demais sócios e se tornará permanente”, diz Ferraz. “Para o segundo corte, faremos nova negociação interna e pretendemos que ele seja permanente.”
Ainda que a Argentina seja “o maior desafio”, o secretário considera que é possível chegar a um acordo sobre a nova rodada com os demais países do bloco, já que desde 2019 Paraguai e Uruguai “se manifestaram favoráveis a cortes ainda mais ambiciosos da TEC”. Mas, mesmo sem o apoio argentino, “há sempre a possibilidade” de que os países “façam as reduções tarifárias em momentos não necessariamente coincidentes”.
De acordo com ele, o Brasil pode usar “alguma cláusula de exceção que dê embasamento jurídico” para um segundo corte temporário, ainda que o primeiro não tenha se tornado permanente. “Mas sempre buscaremos a via negociada.”
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou mais de uma vez que o governo federal pode reduzir a TEC novamente até o fim do ano, mas sem dar maiores detalhes. “Estamos começando a abrir a economia”, disse em fevereiro em evento promovido pelo BTG Pactual. “Baixamos a TEC e podemos baixar de novo antes do fim do governo.”
Por Rafael Bitencourt e Rafael Walendorff — De Brasília
25/03/2022
Fonte: Valor Econômico